segunda-feira, 23 de agosto de 2010

III Encontro Cineclubista Lanterninha


O terceiro Encontro Cineclubista Lanterninha foi pautado pelo tema: “A escola pública e o mito do heroi”. Após a exibição do filme Escritores da Liberdade na sala Walter da Silveira, migramos para a sala multi-uso da Dimas para configurar nossa roda de bate papo.  No caminho entre as duas salas, pausa para conferir uma exposição sobre clássicos do gênero de animação no audiovisual baiano.






Acomodados em um grande círculo, olho no olho, aos poucos vão surgindo as primeiras leituras do filme. Dois professores, que também são cineclubistas, deram seus depoimentos ainda emocionados com a trajetória de superação apresentada no filme. Na realidade todos saíram da sala de cinema enxugando as lágrimas.

Escritores da Liberdade é um filme do diretor americano Richard Lagravenese (2007), classificado como gênero de drama, baseado em fatos reais, cuja história se passa por volta de 1992, em Los Angeles (EUA) em um contexto de guerra urbana em seus bairros mais pobres, causados por gangues e motivados por tensões raciais. Uma professora de inglês novata se depara com uma turma de alunos que cumprem medidas sócio-educativas e estão na escola por ordem da justiça. A turma é muito diferente do sonho de educação que a jovem professora nutria quando buscou a escola que vivenciava um processo de integração, acolhendo jovens integrantes de gangues que naquele ano, guerreavam em Los Angeles.

O filme transcorre, com uma medida cada vez maior de emoção, pois nos aproxima do drama de vida de cada um dos adolescentes. Ao mesmo tempo que a camera nos coloca como um daqueles jovens sem esperança, dispostos a morrer tentando matar seus inimigos, distantes de qualquer perspectiva de futuro, somos colocados no ponto de vista da jovem professora que decide enfrentar um sistema educacional ultrapassado para oferecer aos seus alunos uma chance para a mudança. Devolver a esperança através da educação.

Para além da emoção, este filme foi escolhido para o Encontro, por lançar possibilidades infinitas de exploração do tema da educação, e principalmente questões a respeito da representação dos papéis de professor e aluno no cinema hollywoodiano.  A nossa proposta era de desconstrução do filme.




O mito do herói é a estratégia dramtúrgica escolhida para narrar a trajetória da professora novata em contato com esse universo violento. O filme apresenta os clichês mais conhecidos da indústria norte-americana e por isso garante um filme bem “redondo” a nossos olhos ocidentais. Aprender a descontruir um filme, mais do que considerá-lo bom ou ruim, nos dá a possibilidade de fruir com muito mais complexidade a obra colocada em questão. Perceber pontos de vista diferentes sobre o mesmo objeto, nos traz uma grande riqueza de pensamento. E foi isso que exercitamos no ultimo encontro.

Falamos desde o consenso sobre a emoção que o filme faz aflorar até nos mais precavidos e evoluímos para pensar que existe uma simplificação do processo educativo nos filmes da indústria norte-americana. No filme é creditado ao professor (o herói), a possibilidade de modificar a vida dos seus alunos, por maiores as dificuldades que ela precise ultrapassar para isso. A jovem professora para dar conta da transformação que tanto deseja, precisa conciliar três empregos simultâneos (para custear atividades extra), além de perder o marido por colocar a relação pessoal no plano do menos importante. Mas ela resiste a tudo impávida, afinal tem uma missão a cumprir.

Pessoalmente acho que essa é uma carga muito pesada para o professor, que mesmo sendo idealista e lutando contra as dificuldades abissais da sua profissão, precisa ter uma rede social que lhe dê suporte, precisa dos amigos e da família, seja ela como for. Não é à toa que a toda a mudança que a professora propõe aos alunos no filme, em momento nenhum dialoga com a realidade que eles encontram fora da sala de aula. Como lembrou Clissio (novo monitor do Projeto lanterninha), é como se aquele universo criado pela professora fosse uma bolha suspensa no ar, e não admitisse a entrada de novos elementos ou a relação com os outros mundos que habitam a escola.



No dia estavam presentes os professores Edvaldo e Rita, cineclubistas da Escola Parque, que com o idealismo e a paixão necessárias à profissão que lhes trazem sentidos, trouxeram a discussão para nosso contexto de educação pública no Brasil. Onildo, professor de história da Uneb relatou sua experiência ao ver o filme, e pensá-lo como dispositivo de reflexão para a realidade das escolas públicas que não deveria ser mitificada.

O momento final do Encontro foi dedicado a discutir questões técnicas da construção narrativa do filme, e a importância de estabelecermos uma instância crítica do que consumimos audiovisualmente.

Foi uma manhã muito animadora de debate. Como em todos os encontros, saímos com gostinho de quero mais e desta vez em especial, de posso mais. Posso sim, transformar o contexto à minha volta. Mais do que cair na sala de aula de uma professora tão virtuosa, nos cabe elaborar à duras penas uma educação de maior qualidade. A escola é um espaço de todos, vamos tomar assento e chegar mais.

Por: Tenille Bezerra
Coordenadora Executiva do Projeto Lanterninha
tenillebezerra@gmail.com

3 Comentários:

Às 26 de agosto de 2010 às 11:48 , Blogger Acompanhante disse...

Pena que não pude ir a esse encontro! Assistimos a esse filme internamente no Lanterninha e foi curioso a impressão que nos causou: todos choramos e acreditamos no mito do grande herói, mas quando retornamos para o cotidiano das escolas e da vida mesmo, vemos que é muito injusto nos basearmos nessa história de uma professora (rica e judia) que abdica de seu casamento e despende seu tempo para o trabalho na escola com alunos marginalizados e violentos, trabalha em mais dois empregos para custear idas desses alunos a museus e compra de livros. Uma visão unilateral da vida...um filme muito bem dirigido, utilizando todos os recursos para dramatizar uma história real, mas ao meu ver muito equivocado. O DEBATE DEVE TER SIDO INCRÍVEL!!!!

 
Às 28 de agosto de 2010 às 05:45 , Anonymous Anônimo disse...

Minha gente,
Assistir ao filme "Escritores da Liberdade" mais ou menos umas três vezes (acreditem) e confesso que a representação do professor trazida por esta obra me incomoda bastante.

Acredito que para atuar numa escola todo educador precisa ser engajado, idealista, otimista e precisa acreditar, mesmo minimamente, no potencial de seus alunos e em possibilidades de transformações. Mas o docente, por si só, não conseguirá tal proeza.

O filme "Escritores da Liberdade" tenta nos fazer acreditar que uma andorinha só faz verão. E quem trabalha e vive o cotidiano escolar, sabe que uma série de fatores (violência, descaso, ausência de politicas publicas, lacuna na formação dos professores) contribuem para que muitas vezes os processos educativos não dêem certo. O filme ainda me faz pensar na seguinte questão: De quem é a responsabilidade de transformar e potencializar a escola pública? È somente da heroina Erin?

Vamos pensar nisso...

 
Às 28 de agosto de 2010 às 05:48 , Anonymous Daiane Silva disse...

Esse anônimo aí em cima sou eu!!! Daiane!!!

 

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial